Experiência | Refeitório do Senhor Abel, Marvila
Mais de 2 meses depois da última saída social, aceitei o convite da equipa do restaurante Refeitório do Senhor Abel e fui conhecer a sua nova carta de Inverno.
Aceitei para provar coisas boas, na minha semana de férias. Aceitei porque, as pessoas que conheço que visitaram o espaço todas falam que se cumpre o distanciamento e todas as regras de limpeza. Aceitei porque vão 3 meses de luto e havia de me testar e ver se "consigo estar com pessoas".
E sim, correu bem, estivemos em mesas pequenas, fomos muito bem recebidos e acima de tudo, as novidades da carta e os ingredientes são de tão elevada qualidade que, tal como disse no Instagram, tudo funcionou como um abraço, que me acalentou e animou.
O espaço é giro, irreverente, vive das memórias de quando era um refeitório de homens de trabalho, e visitado por génios, como Fernando Pessoa. À entrada somos levados para um mundo de livros e de Letras, algo que não se espera num refeitório, mas que lá pertence, por entre relíquias decorativas, madeiras nobres e a "Árvore do Conhecimento". (É um gosto ouvir os funcionários contar as histórias e poder ver os detalhes enquanto se janta)
Mas vamos lá falar do menu. Os reis são a abóbora e o queijo - algo a que eu "bati palminhas", porque são ingredientes que uso muito e que procuro sempre conhecer melhor, quando saio ou quando compro takeaways nos dias em que não me apetece cozinhar.
Começámos pela entrada, a Terra Nostra, uma interpretação da bruschetta em que o pão de alho de massa de pizza aparece ladeado de uma Mozzarella de Burrata (bem cremosa e ácida) e um molho de Peperonata (tomate, pimentos, alho e azeitonas).
Seguimos para o Venere, um prato de arroz Venere negro com carpaccio de salmão fumado e abacate com toques de sésamo, vinagre-creme balsâmico, creme de batata doce e um crocante de parmesão. O arroz chega crocante, na textura perfeita para balançar com o salmão fresco e o abacate maduro. O creme de batata doce, que "no papel" parecia-me demasiado, liga bem, e funciona quase como um "molho de ligação", leve e nada doce. O crocante de parmesão, para mim, é mesmo o rematar do prato, com o toque de salgado necessário.
Passámos para a Pizza del Nono, que me captou logo de início porque o molho de tomate é substituído completamente por um creme simples de abóbora - perfeito para intolerantes a acidez do tomate, como eu. Massa de Grano Arso (um tipo de trigo torrado) que dá mais profundidade à massa, creme de abóbora assada no forno só com um toque de azeite, mozzarella, cebola roxa, queijo de cabra, nozes torradas, tomate cereja confitado (que eu retirei), bacon e figos secos. Os sabores conjugam na perfeição, a pizza é de ótima tamanho dando bem para duas pessoas. E o queijo conjugado com a abóbora e o figo... Deus Meu!
Finalizámos os pratos salgados com o melhor gnocchi 4 Formaggi (gnocchi de batata com molho de Gorgonzolla, Mascarpone, Scamorza, Parmesão e ervas) que alguma vez comi: os gnocchi leves e o molho rico mas equilibrado entre os 4 queijos e as ervas nada overpowering. Para mim, este prato representa a confort food, o miminho de que todos precisamos nos dias difíceis de inverno.
E para sorrir, um prato de sobremesas típicas italianas: cheesecake de frutos vermelhos (com duas densidades no recheio), cannolis sicilianos com um toque de pistácio (e eu que adoro pistácio?!) e 3 sabore de gelado artesanal (figo da Índia, meloa com malagueta e pistácio com gin e pimenta) que provam que gelado também pertence ao inverno - especialmente o de meloa com malagueta que roubou os nossos corações.
A esta minha saída, à calma com que jantámos brindamos ainda com o sempre bem-vindo Limoncello.
Resumindo: queres aconchegar coração e estômago com ingredientes de boa qualidade? Visita o Refeitório do Senhor Abel, ou recorre ao seu takeaway, sempre disponível.
Há que assumir que sabem representar o inverno no prato: o frio que necessita de calor, o dia feio que necessita de cor.
O gnocchi 4 formaggi ficou no meu coração, a pizza del Nono abriu os meus horizontes, o cannolli é dos que vai ser falado cá em casa durante semanas.
A equipa é atenta, rápida, simpática e com gosto de estar lá e connosco.
Para mim é um 4,5/5, muito porque apresenta alternativas a intolerâncias e eleva a cozinha italiana a mais do que pão e tomate.
Recomendo.
*refeição oferecida pelo estabelecimento